Francisco Candido Xavier

Aos nove anos, seu pai, já casado novamente, empregou-o como aprendiz numa indústria de fiação e tecelagem. De manhã, até às 11 horas, frequentava a escola primária pública, depois trabalhava na fábrica até às 2 horas da madrugada. Aprendeu mal a ler e a escrever. Quando concluiu o pequeno curso da escola pública empregou-se como caixeiro numa loja e mais tarde como ajudante de cozinha e café.

Em 1933 o Dr. Rómulo Joviano, administrador da Fazenda Modelo do Ministério da Agricultura, em Pedro Leopoldo, deu ao jovem Xavier, uma modesta função na Fazenda e lá se tornou um pequeno funcionário público em 1935, tendo trabalhado consecutivamente até finais dos anos cinquenta, altura em que foi aposentado por invalidez (doença incurável nos olhos), com a categoria de escrevente datilógrafo . Não podemos deixar de registrar, sob pena de cometermos grave omissão, que durante as décadas que esteve ao serviço do Ministério da Agricultura, jamais — não obstante a sua precária saúde e trabalho doutrinário, fora das horas de serviço — deu uma única falta ou gozou qualquer tipo de licença, conforme documentos facultados pelo M. A. Em finais da mesma decáda de cinquenta, vai residir em Uberaba – MG, por motivos de saúde e a conselho médico, onde permanece até hoje e apenas com a sua magra reforma (aposentadoria).

As suas faculdades mediúnicas são extraordinárias. Sua mediunidade (capacidade natural de ser intermediário entre o plano material e o plano espiritual) manifestou-se, quando tinha 4 anos de idade, pela clarividência e clariaudiência, pois via e ouvia os Espíritos e conversava com eles sem a mínima suspeita de que não fossem homens normais do nosso mundo. Já como jovem e depois como adulto, muitas vezes não diferencia de imediato os homens dos Espíritos. Aos 5 anos, já órfão de mãe, esta manifestou-se várias vezes junto dele encorajando-o e dizendo-lhe que não poderia ir para casa porque estava em tratamento, mas que enviaria um bom anjo que juntaria novamente a família. Esse bom anjo foi a D. Cidália, a segunda esposa de João Xavier, que para casar com o seu pai fez questão de reunir todos os filhos do primeiro casamento e lhe daria depois mais cinco irmãos.

Quando tinha 17 anos, fundou-se o grupo espírita Luiz Gonzaga , onde rapidamente desenvolveu a psicografia, isto é, a faculdade de escrever mensagens dos Espíritos. Época em que se desligaria da Igreja Católica onde deu os primeiros passos na espiritualidade, mas onde não encontrava explicação para os fenômenos que se passavam com ele, designadamente a perseguição de espíritos inferiores de que era alvo. O padre que o ouvia nas confissões foi um conselheiro, um verdadeiro pai e não o dissuadiu do caminho que iniciou no Espiritismo, mas abençoou-o e nunca deixou de ser seu amigo.

No centro espírita começou a psicografar poemas notáveis de famosos poetas mortos, num nível literário tão elevado que os próprios companheiros do grupo não conseguiam atingir integralmente o seu conteúdo. Muitos desses poetas eram totalmente desconhecidos do meio, nomeadamente alguns portugueses: António Nobre, Antero de Quental, Guerra Junqueira e João de Deus. A 9 de Julho de 1932, seria publicada a célebre “Parnaso de Além-Túmulo”, a sua primeira obra psicografada que iria abalar os meios intelectuais do Brasil e tornar conhecida a pacata Pedro Leopoldo. O estilo dos 56 poetas mortos, entre os quais vários portugueses, era precisamente idêntico ao estilo dos mesmos enquanto vivos, informavam os literatos das academias e universidades dos grandes centros culturais do Brasil, embora não soubessem explicar o fenômeno. Seria o início da sua imponente obra mediúnica que hoje já ultrapassa os 350 livros.

Bastava apenas um desses livros para constituir um roteiro seguro para o homem na Terra rumo à sua alforria, à sua felicidade. Seus ensinamentos revivem plenamente o Evangelho de Jesus e as lições do Consolador que Kardec – o discípulo fiel de Jesus – nos legou com tanto sacrifício e renúncia.

Mais de mil entidades espirituais nos deram informações através das suas abençoadas mãos, provando à saciedade a imortalidade do Espírito e a sua comunicabilidade com os homens. Mas falar de Chico Xavier é falar de Emmanuel que indelevelmente estará ligado à sua missão. Esse venerando Espírito é o seu protector espiritual e manifestou-se-lhe pela primeira vez de forma ostensiva em 1931, acompanhado-o desde então até hoje. A respeito desse Benfeitor espiritual nos diz o próprio médium:

“Lembro-me de que num dos primeiros contactos comigo, ele me preveniu que pretendia trabalhar ao meu lado, por tempo longo, mas que eu deveria, acima de tudo, procurar os ensinamentos de Jesus e as lições de Allan Kardec e disse mais que, se um dia, ele, Emmanuel, algo me aconselhasse que não estivesse de acordo com as palavras de Jesus e Kardec, que eu devia permanecer com Jesus e Kardec, procurando esquecê-lo”.

Emmanuel propõe ainda ao jovem Xavier mais três condições para com ele trabalhar:

1ª condição, DISCIPLINA,
2ª condição, DISCIPLINA,
3ª condição, DISCIPLINA.

 

Entre as muitas dezenas de obras mediúnicas de Emmanuel, destacamos os cinco documentos históricos, retirados dos arquivos do plano espiritual, que constituem autênticas obras primas de literatura, e que nos mostram o nascimento do cristianismo e a sua paulatina adulteração logo nos primeiros séculos da era. São os romances mediúnicos baseados em factos verídicos: HÁ 2000 ANOS … (a autobiografia de Emmanuel, a história do orgulhoso senador romano Públio Lentulus),” 50 Anos depois”, “Ave Cristo” , “Rnúncia” e “Paulo e Estêvão” (a história de um coração extraordinário, que se levantou das lutas humans para seguir os passos do Mestre, num esforço incessante ). Esta última obra, de 553 paginas, por si só justificaria a missão mediúnica de Chico Xavier, segundo o erudito J. Herculano Pires.

Em 1943 começara a utilizar a mediunidade do abnegado médium, uma nova entidade espiritual que assinará as suas mensagens com o nome André Luiz. Quem não conhece, mesmo aqui em Portugal, a quadra:

Não se irrite – SORRIA
Não critique – AUXILIE
Não grite – CONVERSE
Não acuse – AMPARE

André Luiz é o pseudónimo utilizado por um espírito que foi médico e cientista na sua última existência e que desencarnou numa clínica do Rio de Janeiro pelo início da década de trinta. É considerado o verdadeiro repórter de além-túmulo. Relata-nos numa séria de 11 livros a experiência do seu passamento, as dificuldades iniciais, o reencontro com familiares e conhecidos que o precederam na partida para o plano espiritual, a observação e as expedições de estudo junto de Espíritos de elevada evolução. Esses relatos começam com o já célebre, livro NOSSO LAR (nome duma cidade do plano espiritual), hoje traduzido em vários idiomas, entre eles o japonês e o esperanto e que já vai na 40ª edição em Português, com 800.000 exemplares editados até hoje. Obra que também iria causar e ainda causa uma certa polémica. Nessa série de reportagens, a alma humana é profundamente escalpelizada, e onde se confirma na prática os ensinamentos que Jesus nos legou há dois milênios atrás e que Kardec relembra e amplia tão bem sob orientação do Espírito de Verdade. Um dia, no futuro, os médicos, os psicólogos, os sociólogos, etc., ficarão admirados pela sabedoria neles contida, que já no século XX se encontrava no Planeta, apontando diretrizes seguras para a felicidade e paz entre os homens.

A obra monumental de Chico Xavier que se considera, segundo suas próprias palavras: um servidor humilde (humilde no sentido da desvalia pessoal) , jamais serviu para beneficiar materialmente a sua pessoa. Todos os direitos autorais foram cedidos graciosamente a instituições espíritas, nomeadamente à Federação Espírita Brasileira, e a instituições de solidariedade social. Quando as autoridades públicas lhe concedem títulos de cidadania (mais de cem já lhe foram concedidos) diz que o mérito não é para ele mas para os Espíritos e sobretudo para a Doutrina Espírita que revive os ensinamentos de Jesus na sua plenitude e que ele não passa de um poste obscuro para a colocação do aviso de que a Doutrina Espírita foi premiada com essas considerações públicas.

Há que registrar também que várias centenas de instituições de solidariedade social foram criadas e inspiradas no seu exemplo e obra: orfanatos, escolas para os pobres, lares de deficientes, sopas dos pobres, campanhas do quilo, ambulatórios médicos, alfabetização de adultos, bibliotecas, etc., etc.

Antes de encerrarmos estas notas gostaríamos de registrar ainda o seu ponto de vista em relação às outras doutrinas, filosofias e ideologias, aliás que são o do próprio Espiritismo, mas passemos-lhe novamente a palavra:
Nosso amigo espiritual, Emmanuel, nos aconselha a respeitar crenças, preconceitos, pontos de vista e normas de quaisquer criaturas que não pensem como nós, mas adverte-nos que temos deveres intransferíveis para com a Doutrina Espírita e que precisamos guardar-lhe a limpidez e a simplicidade com dedicação sem intransigências e zelo sem fanatismo.

Estes são alguns dos traços biográficos desse abnegado benfeitor que renunciou a tudo para que o mundo seja um pouco melhor e que dá pelo nome simples de Chico Xavier.

(Retirado da Revista do II Congresso Português de Espiritismo)